Clipe mostra a realidade dos moradores da Favela da Linha, no bairro Parque Guarús, em Campos dos Goytacazes
segunda-feira, 24 de novembro de 2008
Sonho Deturpado
Por Walace, Idalina, Priscila, Bruna e Rodrigo
Moradores da favela da linha aguardam ansiosos por conclusão das obras do conjunto habitacional Boa Vista
Em uma caminhada pela favela da Linha, situada entre o trilho do trem e a BR 101, em Guarus, observamos uma triste realidade que comparada à arrecadação obtida pela cidade de Campos do ano passado até este mês, de R$ 1,21 bilhões entre royalties e participação especial, nos fez tentar buscar uma resposta a tanto descaso. Pessoas vivendo em situação subumana com tão pouco e mesmo com todas as dificuldades, era visível em cada olhar o brilho e a esperança de ter uma vida melhor. Conhecemos entre 10h e 15h muitas famílias, pessoas que nos receberam de braços abertos.
Entre as pessoas que conhecemos, uma nos chamou mais atenção, a Mariana Batista Gomes, uma mulher de 25 anos, mas com aparência de aproximadamente 40, de cabelos esvoaçantes, aparentemente acima do peso, que mora numa pequena casa de paredes sujas e divididas com vizinhos. No pequeno quintal à frente de sua casa, rebaixada ao nível da BR, lá estava ela com sua vassoura. Ao ser abordada por nós, apesar de não ter tido muita oportunidade de estudo, não completando ao menos o ensino fundamental, nos atendeu muito bem contando como é viver na favela da linha.
Mariana nos disse que comprou sua casa por apenas R$ 500, uma quantia que para alguns é quase nada, mas para ela significou ter um teto. Pelo estado critico da casa podemos perceber o que ela mesma falou, “se não morar aqui, vou morar na rua com minha família”, ou seja, Mariana, seu esposo e o filho do casal não têm escolha quanto onde morar.
“A prefeitura deve às famílias que moram na favela da linha um trabalho de planejamento para assentá-las, pois elas estão em extensão considerada de risco. Com o tempo as famílias foram se apropriando indevidamente do local”, disse Adriana Barreto Peres, Assistente social da Empresa Municipal de Habitação (Emahb).
A família vive com apenas um salário mínimo, R$ 415, sua casa não tem banheiro nem água, sua luz é irregular e eles contam com apenas dois cômodos. Não entramos na casa de Mariana, mas a porta aberta nos permitiu ver que não havia móveis, o chão era de cimento grosso e no varal do quintal tinham algumas peças de roupa bastante surradas secando. Ao pedirmos para tirar uma foto ela falou, “agora? Estou tão mal vestida”, com um sorriso envergonhado na face Mariana aceitou ser fotografada.
Ao falar das casas populares dos bairros Boa Vista I e Boa Vista II localizados próximos a sua casa, seu olhar brilhou, acreditando que morando em um lar com água, luz e saneamento básico, a qualidade de vida da família melhoraria, principalmente para seu filho de dois anos, que não pode brincar em frente à sua casa por causa da BR 101, a maior e mais transitada rodovia federal do país.
Os conjuntos habitacionais Boa Vista I e II somam 250 casas, que estão em construção há cerca de cinco anos com o início das obras no governo estadual de Rosinha Garotinho. Logo após Sérgio Cabral assumiu o governo do Rio e não continuou com as obras passando a responsabilidade para a prefeitura municipal, esta última retornou com os trabalhos nos conjuntos em agosto deste ano.
A real situação dessa família é uma entre muitas outras e a insatisfação de Mariana é latente mesmo não sendo em palavras, mas em gestos, expressões e olhares. Seu esposo trabalha na roça e a maior parte do dia ela fica em casa só com seu filho. Vive com muito pouco e em um lugar precário, vê passar à sua frente cargas com tantas coisas que nunca pôde experimentar, mas ainda assim ela espera um futuro melhor.
Quando chove, por todas as casas estarem abaixo do nível da rodovia, a casa de Mariana fica alagada, perdendo assim o pouco que conseguiu conquistar até a presente data. Com a construção de uma barricada não entra mais tanta água nos barracos e ela conta isso com a alegria de quem teve sua vida melhorada em 100%. O que nos fez refletir sobre como algo pequeno para muitos, pôde trazer tanta felicidade para uma pessoa.
Mariana provavelmente ainda não sabe que seu nome não consta na lista dos beneficiados com as casas do Boa Vista, um total de 278 moradores cadastrados. E o que será feito com as 28 famílias restantes, entre elas a de Mariana, que moram Favela da Linha e deverão sair em virtude da privatização do trecho da BR101 em que a favela esta localizada, algo em torno de 7 km? Em resposta a esta questão a prefeitura de Campos, através da Emahb, informou que será pago o chamado Aluguel Social.
Um programa voltado para as famílias de vulnerabilidade social, que consiste no pagamento de um aluguel, no valor de R$ 175 por cinco meses. Muitos não aceitam por medo de passado o prazo o dinheiro não seja mais fornecido. Ao escolher as moradias que serão alugadas os beneficiados continuam sendo acompanhados pela secretaria de Promoção Social. De acordo com informações do site da prefeitura, a previsão é de que as famílias deixem a favela da linha até o natal deste ano.
Nossa conversa chegou ao final com o choro do bebê que estava dormindo e acordou. Ficou para outra visita uma conversa mais interativa e reveladora, para assim conseguirmos entender de fato o que se passa no coração da Mariana, essa mulher que sonha em poder oferecer para seu filho uma vida melhor com mais oportunidades, para que no futuro ele não precise passar pelos problemas que ela tem de enfrentar hoje em dia.
Saímos da favela e fomos buscar respostas do poder público sobre tudo o que vimos.
Descobrimos que a casa de Mariana está inscrita para receber uma nova, mas não em seu nome, ela está cadastrada para o antigo dono. Talvez nossa nova amiga não seja contemplada com uma casa do Boa Vista, mas com o aluguel social. Ficamos na dúvida se devíamos voltar e contar este triste fato a Mariana, como nada ainda foi resolvido preferimos não frustrar suas expectativas cedo demais.
A favela da linha nos reafirmou a importância que tem cada Prefeitura de oferecer para sua população saneamento básico, água potável, luz, urbanização e segurança. Respeitando e atendendo necessidades básicas para sobrevivência de seus moradores, que votam sempre confiando na mudança.
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